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27 de outubro de 2014
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O que fazer depois das eleies? 29z29

H momentos que a coisa aperta mais, quando os argumentos defendidos doem nos ouvidos e no corao. Lembro-me bem quando meu pai quase traiu seu prprio princpio. Eram as eleies de 1989, e havia uma forte inclinao dos membros de sua comunidade a votar na onda pr-Collor. Foi quando ele disse publicamente algo assim: no devemos votar em algum s por parecer boa pinta e nem deixar de votar em outro s porque o chamam de sapo barbudo. Cheguei perto do meu pai cantarolando baixinho Lula-l e lhe disse algo assim: quase escapou dessa vez, hein, vinho, chamando-o com esse carinhoso apelido de famlia, um costume desde a poca em que seus reluzentes fios de bigode preto despertavam a inveja de seus colegas de pastorado.
Deixemos o sapo e o bigode, e voltemos eleio. Ou melhor, ao que me parece mais importante agora, o ps-eleies. Creio que importante refletir sobre isso pelo tipo de clima animoso que se instalou. Seria bom ter cuidado com o que o Hlio outro dia na Folha chamou de patologias de grupo. Sobre seus sintomas, incluem radicalizao, excesso de otimismo e a tendncia de desumanizar o adversrio. Seriam vulnerveis os grupos compostos por pessoas que se percebem como semelhantes, o que ocorre quase naturalmente numa eleio polarizada. O remdio proposto, muito adequado por sinal, semear a dvida, de modo a quebrar a iluso de consenso1.
Para muita gente da banda dos que tem f, a medicina proposta parece ser a de associar a sua crena com determinado projeto poltico. Claro que um movimento natural e at mesmo se espera que minhas convices religiosas (ou polticas, ou ideolgicas) me levem a tomar partido e a escolher lados. O problema quando essa posio parece excluir ou no tolerar em seu prprio grupo quem chegue a uma concluso diferente. A agressividade da campanha pareceu indicar que esse tipo de postura se fortaleceu.
Estava matutando sobre isso nesses dias quando casualmente li um excelente artigo da Eliane Brum sobre a fronteira norte do Brasil. L pelas tantas, ela afirma: Deus muito popular em Roraima. O problema que l, como no resto do mundo, no se sabe bem de que lado est. () No um conto de bandidos e mocinhos, porque os maniquesmos fazem mal ao jornalismo. Mas uma histria mais complicada, como sempre so as paixes e os sonhos humanos2. Maniquesmos fazem mal no s ao jornalismo, Eliane, mas tambm afetam em nossas comunidades de f a capacidade crtica e de dialogar com profundidade.
Eleies vem e vo, ento o que fazer depois que am? Aqui segue uma breve e humilde sugesto de alguns prximos os:
- Se o seu candidato ganhou as eleies, evite se comportar como torcedor baboso de time que ganhou clssico. Respeite quem votou diferente. Se voc deseja ganhar o respeito dos outros, deve ser o primeiro a respeitar a opinio alheia e garantir o direito do outro de que sua voz tambm seja ouvida.
- Se o seu candidato perdeu as eleies, lembre-se que o exerccio do voto apenas uma parte da democracia, ainda que bem importante. A cidadania continua em todo o tempo, na oposio saudvel, inteligente, proftica, denunciando o mal e pressionando pela justia. No d para se esquecer da nao e s querer voltar ativa nas prximas eleies. Claro, estou considerando que era apenas um arroubo a ameaa de deixar o pas e ir para Miami, Paris ou Assuno. Alis, pelo que vi, o destino preferido parece ter a ver menos com a ideologia e mais com o oramento. Ironias dessa vida.
- Se voc resolveu votar branco ou nulo, respeito e entendo sua posio. Mas possivelmente, e respeitosamente, te animaria a no fazer o mesmo nas prximas eleies. A gente tem que se posicionar, ainda que as opes muitas vezes estejam longe do ideal (quando sero ideais?). Talvez eu defenda isso porque no aprecio a postura (seja de quem perdeu a eleio ou de algum que votou branco ou nulo) ao sair dizendo depois que no tenho nada a ver com esse governo que est a, como se isso eliminasse a nossa responsabilidade de uma contnua cidadania participativa. Mas, tudo bem, entendo a bronca, deixo apenas uma humilde sugesto para no se abster desses processos.
Se voc da minha banda (no do meu candidato, que nem te disse qual ), mas partilha a mesma f que eu tenho, algumas breves e finais recomendaes:
- Siga sempre orando pelas autoridades, seguindo os princpios de Pedro e Paulo, esperando que eles busquem a justia, cobrando isso, esperando e trabalhando para que eles punam o mal e faam o bem. Essa tarefa nunca termina, seja qual for a autoridade l no poder.
- Busque sempre o shalom (a reconciliao, a harmonia, o bem-estar) do pas onde o Senhor nos colocou. Se mesmo no exlio, na Babilnia, o povo foi exortado por Deus a faz-lo, busquem o shalom da Babilnia, ento no consigo entender que no o busquemos em nossa prpria nao. Veja l no captulo 29 de Jeremias que essa busca implicava em projetos de longo prazo, construir, plantar, colher, casar, ter filhos, que os filhos tenham filhos. Leva tempo construir o shalom. Veja bem que isso se d independentemente de quem esteja no trono, Nabucodonosor ou Ciro, no esse o tema. A fidelidade no longo prazo com certeza uma tarefa responsvel daqueles que buscam viver hoje luz da f e da Palavra em que acreditam.
Meu querido pai, parece que dessa vez ainda consegui manter aquele princpio. Mas no sei se na prxima vou conseguir me segurar. Meu consolo ser lembrar-me do seu deslize com um sapo barbudo. Um grande abrao.
-- Texto escrito antes das eleies. As ideias aqui descritas se aplicam, creio eu, qualquer seja o resultado.
Notas:
1. Hlio Schwartsman, Patologias eleitorais, Folha de So Paulo, 21/10/2014.
2. Eliane Brum, O Olho da Rua, Ed. Globo, Pos. 531-532, 591-592 (E-book Kindle).
Foto: Rafael Neddermeyer/ Fotos Pblicas
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A eleio e as eleies
Eleies 2014:Carta Pastoral
A falncia dos deuses
casado com Ruth e pai de Ana Jlia e Carolina. Integra o corpo pastoral da Igreja Metodista Livre da Sade, em So Paulo (SP), serve globalmente como secretrio adjunto para o engajamento com as Escrituras na IFES (International Fellowship of Evangelical Students) e tambm apoia a equipe da IFES Amrica Latina.
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