Opinio 3pp3w
02 de fevereiro de 2021
- Visualizaes: 6194
comente!
- +A
- -A
-
compartilhar
Incluso social o que a teologia diz 63l56
PorLoureno Stelio Rega

Como resultado, ao longo do tempo, na legislao brasileira tem surgido diversos cdigos legais, em geral chamados de Estatuto assegurando no apenas direitos de igualdade, mas tambm promovendo a valorizao das pessoas seja qual for seu estado e condio. Assim temos:
- Estatuto da criana e do adolescente (ECA)
- Estatuto do idoso
- Estatuto da pessoa com deficincia
A histria repleta de segregaes e marginalizaes a depender de diversos fatores, tais como: cor de pele; etnia; sexo; famlia; classe social; condio intelectual, financeiro-patrimonial, fsica; estado de sade, especialmente mental etc.
Como se pode observar a amplitude do tema requer seu tratamento por meio de diversas reas de atuao, inclusive no campo da Teologia. Sendo nosso ponto de partida a viso judaico-crist, iremos seguir este caminho em busca dos fundamentos para o tratamento do tema.
Temos de comear do comeo, isto , da narrativa da Criao.
Estudiosos da literatura hebraica e bblica demonstram que a narrativa da criao foi construda em blocos. Assim, no primeiro versculo (Gn 1.1) temos a narrativa geral. Nos versculos seguintes (Gn 1.2-2.4), a ateno da narrativa se estende para o detalhamento mais especfico de como foi a criao, suas fases etc. Temos em seguida, (Gn 2.5-25), o foco na criao e formao do gnero (ser) humano.
Em Gnesis 1.26, 27 temos a informao de que Deus fez o ser humano e lhe deu suas primeiras tarefas. Mais ainda, o fez sua imagem e semelhana. Nas discusses teolgicas esta expresso - imagem e semelhana - no se refere ao aspecto tangvel e fsico, pois Deus Esprito (Joo 4.24 etc), mas aos seus atributos intrnsecos, tais como o volitivo. Mas o fato que se pode destacar dentro de nosso tema que a criao comea com a diversidade e incluso - Criou Deus o ser humano (hebr: Adam) sua imagem... homem e mulher os criou (Gn 1.27). Os dois foram criados mesma imagem do Criador, no apenas um deles. Tambm aos dois, em conjunto, foi dada a mesma misso em sua trajetria de vida, no primeiro a um e depois ao outro em subservincia.
Na terceira fase da narrativa da criao temos mais um fato surpreendente dentro de nosso tema, quando, depois do trmino de seis dias em que tudo foi tido por Deus como bom, no foi bom o gnero humano ser composto de apenas um sexo o masculino (Gn 2.18). O texto nem sempre traduzido do hebraico com toda exatido e profundidade.
Em Gnesis 2.18 temos nas tradues em geral ...no bom que o homem (adam, no hebraico) viva s; far-lhe-ei uma auxiliadora (hebr: ezer) que lhe seja idnea (hebr: kenegdo), ideia repetida no versculo 20. O texto original hebraico revelador, pois a palavra hebraica que traduzimos por auxiliadora (que, no portugus, d a ideia de hierarquia) ezer que significa ajuda, socorro e tambm utilizada para descrever Deus como nosso socorro. Veja, por exemplo, nos Salmos 20.2; 121.1,2; 124.8. De modo que ezer no tem conotao hierrquica, mas em socorro, trazer algo que falta. Ento, este texto no est colocando a mulher numa posio hierrquica inferior ao homem antes da queda, mas no papel de algum que veio a ser um socorro ao homem (adam) para que ele no ficasse sozinho, trazer o que faltava.
Ainda mais, a palavra hebraica kenegdo (neged) que traduzida por idnea (que lhe fosse idnea), significa estar diante de, dando a ideia de que a mulher foi colocada diante do homem (hebr: adam), no abaixo, nem ao lado do macho.
O que podemos aprender com tudo isso que a mulher foi formada no para completar o homem macho simplesmente, mas para completar o que faltava para a humanidade ser humanidade composta por macho e fmea. Veja o paralelo que citamos sobre a imagem de Deus no homem (adam) macho e fmea (Gn 1.27).
Alm disso, kenegdo (neged) d a ideia de que a mulher e o homem estariam diante um do outro e no um sobre o outro e, sendo uma s carne (Gn 2.24), viveriam colegiadamente, isto , tomariam decises sobre a vida em conjunto, num ambiente de dilogo face-a-face. O senso da hierarquia e subjugao viria depois com a queda (Gn 3.16) de modo que podemos concluir que a liderana hierrquica no estava presente na criao, mas depois da rebeldia do ser humano contra Deus. Antes da queda os dois macho e fmea andariam juntos (uma s carne), face-a-face e dominariam juntos a natureza. Depois da queda o macho colocado sobre a mulher para lhe comandar, como consequncia da queda.
Resumindo, na narrativa da criao temos a humanidade como composta de macho e fmea, portanto, heterossexual. Tanto o homem, quanto a mulher possuam a imagem de Deus, foram criados para viverem e decidirem colegiadamente, para gerenciarem juntos a natureza e os fenmenos da natureza. Com a queda inicia um processo de ruptura com o plano original de Deus e o domnio do homem sobre a mulher se instala. Podemos entender que aps a queda inicia o processo de excluso social, de segregao, de subjugao, levando o ser humano em trajetria diametralmente oposta ao Plano da Criao.
Em Gnesis 3.15, logo aps a rebeldia do ser humano contra Deus, temos a providncia divina para a restaurao do Plano da Criao, com o que chamamos na Teologia de protoevangelho, com a promessa de um restaurador das relaes do ser humano com Deus. Assim surge o Plano da Redeno, que detalhado no Novo Testamento com a encarnao de Deus por meio de seu filho Jesus Cristo.
Com o ar do tempo a construo cultural teolgica foi priorizando o Plano da Redeno sobre o Plano da Criao e o projetando escatologicamente para o final dos tempos, de modo que diversos temas importantes sobre a vida humana acabaram deixando de ser priorizados ou lanados em uma nota de rodap das preocupaes necessrias da igreja como um todo. o que podemos chamar de salvacionismo em que o Plano da Redeno, a salvao da pessoa se tornou central no lugar do Deus da criao e seu Plano original. Dizemos que a Soteriologia (parte da Teologia que estuda a doutrina da salvao) se tornou a teologia primeira, em vez de ser Deus (Teologia prpria) a teologia primeira. Humanizamos os interesses da Teologia com o soteriocentrismo.
Como Jesus, quando discutiu sobre o divrcio, que remeteu a discusso para o incio de tudo (Mateus 19.4; Marcos 10.6), necessitamos sempre voltar ao Plano da Criao e ver os arqutipos de Deus para a vida humana em sua trajetria histrica, pois isso indicar a essncia de nossa natureza e as finalidades para as quais existimos.
Assim, nascemos para viver juntos, para conviver em ambiente de igualdade, de acolhimento, em que a fora matriz e impulsionadora o amor, que, alis, a primeira caracterstica do fruto do Esprito (Glatas 5.22,23) que aponta para as principais virtudes de um cristo.
O texto do Evangelho expresso no Novo Testamento repleto de indicadores da igualdade humana, trazendo de volta o Plano da Criao, de modo que, luz da viso crist, no poderia haver (Glatas 3.28):
- nem judeu, nem grego (etnia)
- nem escravo, nem liberto (condio econmica, intelectual, social)
- nem homem, nem mulher (condio de sexo, de diferena de natureza intrnseca)
Claro que o Novo Testamento ainda manteve algumas dependncias culturais com o objetivo de que o Evangelho pudesse ser aceito naquele ambiente cultural. Da entendermos que Paulo orienta Filemon a cuidar de seu escravo Onsimo com amor, mas sem romper com a cultura da escravido presente naquela poca deixando de lhe aconselhar a alforria. O mesmo acontece com a criana e com a mulher, que naquele ambiente nem sequer eram contados e nem poderiam assumir a liderana sobre o homem, no podendo assumir qualquer liderana na igreja, pois isto provocaria, naquele momento, a rejeio cultural do Evangelho. Esse caminho adotado por Paulo seria como que orientao provisria e temporal para que o Evangelho pudesse avanar e trazer de volta as pessoas para o Plano da Criao por meio da rendio aos ps do Mestre.
Mesmo assim a igreja primitiva ia avanando em sua influncia no mundo promovendo o seu revolucionamento (veja Atos 17.6) e, neste caso, vamos lembrar que os povos daquela poca e ambiente eram, muitas vezes, nmades e moravam em tendas e iam por toda parte vivendo e trabalhando. Os que haviam se convertido ao Evangelho de Jesus Cristo seguiam em sua vida, no apenas pregando o Evangelho, mas vivendo-o com toda intensidade a ponto de influenciar o ambiente pelo qual avam com os ideais e valores cristos.
O que seria o mundo hoje se cada cristo, se cada igreja local, se cada denominao, promovesse a volta ao Plano da Criao estimulando a igualdade humana, dando apoio e e a todos para que pudessem viver em amor e harmonia, para que governantes pudessem legislar e dirigir a Nao neste mesmo sentido?
O Plano da Criao tem as caractersticas matriciais para a unidade da raa humana independentemente de sua condio e estado, tem at o Plano para a sua redeno. Como cristos, temos o papel principal deste projeto de Deus e, ento, como superar os paradigmas culturais que ainda podem estar nos detendo de revolucionar o mundo e a vida fora do templo, do domingo, do plpito, alm da atuao clerical, da filosofia fabril funcional (pragmatismo estruturante e institucional), que podem ser instrumentos, mas tm se tornado finalidade ao longo do tempo?
Loureno Stelio Rega telogo, eticista, ps-graduado em Anlise de Sistemas Computacionais.Doutor em cincias da religio, mestre em educao e teologia e membro da Sociedade Brasileira de Biotica.
Texto publicado originalmente na revista Literal, de dezembro de 2020. Reproduzido com permisso.
02 de fevereiro de 2021
- Visualizaes: 6194
comente!
- +A
- -A
-
compartilhar
QUE BOM QUE VOC CHEGOU AT AQUI. 223i1k
Ultimato quer falar com voc.
A cada dia, mais de dez mil usurios navegam pelo Portal Ultimato. Leem e compartilham gratuitamente dezenas de blogs e hotsites, alm do acervo digital da revista Ultimato, centenas de estudos bblicos, devocionais dirias de autores como John Stott, Eugene Peterson, C. S. Lewis, entre outros, alm de artigos, notcias e servios que so atualizados diariamente nas diferentes plataformas e redes sociais.
PARA CONTINUAR, precisamos do seu apoio. Compartilhe conosco um cafezinho.

Leia mais em Opinio 2l1v6s

Opinio do leitor 1t5dh
Para comentar necessrio estar logado no site. Clique aqui para fazer o ou o seu cadastro.
Ainda no h comentrios sobre este texto. Seja o primeiro a comentar!
Escreva um artigo em resposta
Para escrever uma resposta necessrio estar cadastrado no site. Clique aqui para fazer o ou seu cadastro.
Ainda no h artigos publicados na seo "Palavra do leitor" em resposta a este texto.
Assuntos em ltimas 6ik57
- 500AnosReforma
- Aconteceu Comigo
- Aconteceu h...
- Agenda50anos
- Arte e Cultura
- Biografia e Histria
- Casamento e Famlia
- Cincia
- Devocionrio
- Espiritualidade
- Estudo Bblico
- Evangelizao e Misses
- tica e Comportamento
- Igreja e Liderana
- Igreja em ao
- Institucional
- Juventude
- Legado e Louvor
- Meio Ambiente
- Poltica e Sociedade
- Reportagem
- Resenha
- Sessenta +
- Srie Cincia e F Crist
- Teologia e Doutrina
- Testemunho
- Vida Crist
Revista Ultimato 5z423b
+ lidos 1s1q68
- A bno de ter avs e de ser avs
- Francisco, Samuel Escobar memria e honra
- F, transformao social e incluso vida e obra de Jos de Souza Marques
- Os Jardins do den e a Sombra de Abel: uma jornada pela aposentadoria
- Abel e Zacarias: encontrando misso na aposentadoria avanada
- Paul Tournier e a Bblia
- Ser ou no ser me: eis a questo
- Filme Jesus traduzido para a 2.200 lngua, o Bouna
- Samuel Escobar: Sejam meus imitadores - fotografias de uma biografia
- Gerao Z lidera reavivamento da igreja no Reino Unido