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24 de dezembro de 2018
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Os pastores, o trabalho e o divino c1a32

Por Phelipe Reis | Uma semana com personagens do Natal

Algumas narrativas bblicas facilmente nos transportam para dentro das histrias por conta da riqueza de detalhes apresenta pelo autor. J outras, deixam lacunas e interrogaes, instigando a imaginao dos leitores. Um bom exemplo do segundo caso o registro bblico, feito apenas por Lucas, da visita dos pastores a Jesus, logo aps seu nascimento (Lc. 2.8-20).

Quantos eram esses pastores? Quais os nomes? De onde eram? Como era o dia-a-dia de um pastor? Como a sociedade da poca via essa profisso? Porque os outros evangelhos no relatam a visita deles ao menino Jesus? Usando a imaginao e pesquisando um pouco da cultura judaica, podemos tentar reconstruir a cena em que o anjo aparece aos pastores e anuncia o nascimento do Salvador.

Era incio da primavera, poca em que os pastores levavam os rebanhos para o campo, para pastar ao ar livre ou nas encostas verdejantes. Ao cair da noite, os pastores contavam as ovelhas, os bodes e os cordeiros, e verificava como estava cada animal, principalmente aqueles que tinham recebido nomes, como era de costume fazer com seus animais os pastores pacientes e carinhosos.

Ao ar livre e sob o tapete brilhante de estrelas, os pastores dormiam, mas no podiam ter o sono pesado, j que as ovelhas estavam em campo aberto e predadores poderiam aparecer a qualquer momento. Animais dceis e frgeis que so, ovelhas no enxergam alm de vinte metros, no tem garras, no sabem dar coice, no sabem morder, no tem nenhuma forma de se defender, por isso precisam da constante vigilncia e proteo do pastor.

Alguns estudiosos do conta de que a profisso de pastor no era bem vista na sociedade judaica, nos tempos de Jesus. John Stott diz que os pastores no gozavam de boa reputao em Israel e eram vistos como pessoas desonestas e pouco confiveis. Mas foi para esses homens, que cuidavam de frgeis animais, em um lugar comum e singelo, que o anjo do Senhor apareceu, com luzes e efeitos especiais, para anunciar-lhes a grande boa notcia: Hoje, em Belm, a cidade de Davi, nasceu o Salvador que Cristo, o Senhor. Vocs o reconhecero por este sinal: encontraro o beb enrolado em faixas de pano deitado numa manjedoura (Lc. 2.11).

Diante do anjo e cercados pela glria do Senhor, os pastores se encheram de medo o mesmo estado em que ficaram Zacarias e Maria ao receberem a visita angelical. Mas o medo no os paralisou; pelo contrrio, os colocou em movimento, em direo a Belm para averiguar o acontecimento que lhes fora anunciado em primeirssima mo. Chegando ao local, encontraram Maria ainda se recuperando do parto e Jos apreciando o rosto de seu filhinho, que estava deitado sobre o recipiente em que colocavam palha para alimentar os animais. O casal estava radiante de felicidade, afinal, ter um filho era o maior desejo de qualquer casal judeu.

Todos estavam encantados com o menino. Os pastores, mesmo entusiasmados com a alegria da famlia e com o significado do momento, no podiam demorar. No podiam ficar o resto de suas vidas ao redor da manjedoura, contemplando Jesus. Deixar as ovelhas sozinhas por muito tempo era perigoso. Os pastores tinham que voltar. Voltar para seus campos, suas ovelhas, seus trabalhos, suas casas e suas famlias. Esse retorno, claro, no podia ser diferente. Alm de glorificar e louvar a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido, os pastores saram contando a todos o que anjo tinha dito sobre a criana. Queriam que todos soubessem das boas novas de salvao.

Mas, e da? Por que Lucas inseriu em sua narrativa a participao dos pastores? Alm do bvio e de mostrar que Deus gosta de incluir em seus projetos pessoas comuns e at no to bem vistas perante a sociedade, o que mais a histria desses personagens pode nos ensinar? O episdio mostra que, nem sempre, a experincia com o divino acontece dentro dos templos, mas tambm fora deles, nos espaos comuns do cotidiano, como no local de trabalho. Foi assim com Moiss, enquanto pastoreava as ovelhas do sogro. E foi assim tambm com os pastores, enquanto vigiavam seus rebanhos no campo. Isso serve para nos lembrar que no estamos fora do caminho das visitas divinas quando estamos nos dedicando ao nosso trabalho. Sim, o trabalho importa; o trabalho um caminho para Deus.

Phelipe M. Reis jornalista, esposo da Luze e pai da Elis.

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