O Pentecostes foi um presente para a Igreja 4m5x3p

Em harmonia com os eventos que aconteceram depois da ressurreio de Jesus Cristo, buscamos nesta reflexo colocar em perspectiva o significado do Pentecostes em vista da ascenso de Cristo, a qual ocorrera dez dias antes daquele grandioso evento em Jerusalm. Jesus havia ado quarenta dias com seus discpulos, instruindo-os sobre mais detalhes sobre o Reino de Deus. Enquanto isso, ele tambm os instruiu a respeito da Promessa do Pai, o envio do Esprito Santo (cf. At 1.3-5).

Sua ascenso foi tambm a sua exaltao, como podemos ver em Efsios 1.20-21, Esse poder ele exerceu em Cristo, ressuscitando-o dos mortos e fazendo-o assentar-se sua direita, nas regies celestiais, muito acima de todo governo e autoridade, poder e domnio, e de todo nome que se possa mencionar, no ape-nas nesta era, mas tambm na que h de vir. Tal declarao de Paulo foi anteriormente declarada por Pedro, ainda mesmo no seu primeiro sermo pentecostal, Exaltado, pois, destra de Deus, tendo recebido do Pai a promessa do Esprito Santo, derramou isto que vedes e ouvis (At 2.33).

O aspecto chave a ser mencionado neste momento que foi ao ser exaltado que Jesus Cristo recebeu do Pai a promessa do Esprito Santo e que, aps tal fato, ele derramou, isto , batizou o seu povo com o Esprito Santo, de acordo com a promessa divina. H uma ligao imediata e continuada entre a ascenso, exaltao e o batismo que Jesus exerceu no Dia de Pentecostes.

A Promessa do Esprito Santo

Inicialmente, precisamos recorrer ao Antigo Testamento para entender o que seja a Promessa do Esprito Santo. Mesmo que brevemente, encontramos agens que apontam para aquele momento na economia divina em que Deus derramaria o seu Esprito sobre todas as pessoas. Mesmo que de agem, podemos recorrer a Ezequiel, quando profetizou sobre tal derramamento, Aspergirei gua pura sobre vocs e ficaro puros; eu os purificarei de todas as suas impurezas e de todos os seus dolos. Darei a vocs um corao novo e porei um esprito novo em vocs; tirarei de vocs o corao de pedra e lhes darei um corao de carne. Porei o meu Esprito em vocs e os levarei a agirem segundo os meus decretos e a obedecerem fielmente s minhas leis (Ez 36.25-27). Vemos aqui que o Esprito Santo iria guiar o povo de Deus em sua obedincia Lei de Deus, pois a mesma seria posta em seus coraes. Isto explica o que Jeremias quis tambm dizer quando anunciou a nova aliana e que, nas palavras do Senhor, Porei a minha lei no ntimo deles e a escreverei nos seus coraes (Jr 31.33; cf. 31.31-34). A outra profecia chave para tal evento achada em Joel:

E, depois disso, derramarei do meu Esprito sobre todos os povos. Os seus filhos e as suas filhas profetizaro, os velhos tero sonhos, os jovens tero vises. At sobre os servos e as servas derramarei do meu Esprito naqueles dias. Mostrarei maravilhas no cu e na terra: sangue, fogo e nuvens de fuma-a. O sol se tornar em trevas, e a lua em sangue, antes que venha o grande e temvel dia do SENHOR. E todo aquele que invocar o nome do SENHOR ser sal-vo, pois, conforme prometeu o SENHOR, no monte Sio e em Jerusalm haver livramento para os sobreviventes, para aqueles a quem o SENHOR chamar (Jl 2.28-32).

J no decorrer do seu ministrio, Joo Batista anunciou que mesmo sendo ele aquele que batizava com gua para arrependimento, viria aquele que batizaria com o Esprito Santo e com fogo (cf. Mt 3.11-12). Da mesma forma, Jesus Cristo enfatizou o mesmo quando disse aos seus discpulos, No saiam de Jerusalm, mas esperem pela promessa de meu Pai, da qual lhes falei. Pois Joo batizou com gua, mas dentro de poucos dias vocs sero batizados com o Esprito Santo (At 1.4b-5).

Este anncio de Joo Batista foi ampliado por Jesus Cristo quando ele lhes ensinou sobre o envio do outro Consolador, o Paracleto, o Esprito Santo. Inicialmente, ele confortou seus discpulos ao lhes dizer que no era para que eles no se entristecessem, pois, tendo ele ido para o Pai, o Esprito lhes seria enviado. Eles no ficariam rfos; mas consolados pelo Esprito Santo (Jo 14-16).

Mesmo tendo Jesus ensinado sobre o Reino de Deus aos seus discpulos, e naqueles ltimos quarenta dias de sua peregrinao terreal ter mais uma vez lhes ensinado mais sobre o assunto, ele mais uma vez consultado a respeito do reino e se era ali que ele restauraria o reino a Israel. De certa forma, compreensvel o porqu da indagao: aqueles discpulos, assim como todo o povo de Israel, esperavam o Messias vindo no mesmo mpeto e esprito de Davi, o homem forte e guerreiro. Agora, com Jesus ressurreto, nada mais havia a acontecer do que a sua verdadeira entrada triunfal como o Messias que daria entrada a uma nova ordem poltica quele povo que j por muitos sculos se achava sob o jugo de muitos algozes.

Jesus, porm, apresenta uma outra perspectiva do Reino de Deus totalmente inesperada para seus discpulos. Os seus discpulos iriam conquistar o mundo com a pregao do Evangelho, dando testemunho a seu respeito em todas as esferas geogrficas e escatolgicas do mundo: Mas recebero poder quando o Esprito Santo descer sobre vocs, e sero minhas testemunhas em Jerusalm, em toda a Judeia e Samaria, e at os confins da terra (At 1.8).

Assim, O Senhor Jesus Cristo est assentado direita do Pai, constitudo Senhor sobre todas as coisas e sobre todos os poderes que possam existir (Mt 28.18; Ef 1.19-21). Neste perodo de seu reino, o seu povo est constitudo como gerao eleita, sacerdcio real, nao santa, povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz (1 Pe 2.9-10).

O evento do dia de Pentecostes e seu significado (At 1-13)

O evento do Pentecostes est entre os poucos eventos mais extraordinrios que so narrados nas Escrituras. Tempo e espao me impedem de descrever todos os que esto entre tais eventos; no entanto, poderamos aqui incluir o ato da criao como o maior de todos. Inclumos tambm a encarnao, a morte de Cristo no Calvrio, sua ressurreio e ascenso, como sendo aqueles atos de Deus de grandiosidade indescritvel, dado sua magnitude. Deus, em sua misericrdia e amor, se dignou a revelar-nos um pouco, o suficiente para que possamos conhec-lo melhor.

O som, como de um vento muito forte, o anncio da descida do Esprito Santo; o mesmo tem a significncia da presena do mesmo. Tal ato de Deus traz aos presentes uma percepo sensorial da presena de Deus. H muitos exemplos de atos semelhantes no Antigo Testamento, como por exemplo, a presena de Deus no deserto, de dia e de noite, a sara ardente, o vento brando quando Deus falou com Elias. Podemos, no Novo Testamento, ver tal ato no batismo de Jesus Cristo, quando o Esprito Santo desceu em forma de pomba sobre ele (Mt 3.16). Tal evento no se repetiu da mesma forma que foi narrada em Jerusalm e nem esperado que se repita. Achamos em outras partes de Atos que o Esprito Santo desceu sobre diferentes pessoas, mas o formato (se posso dizer, litrgico) do Dia de Pentecostes no mais ser repetido.

O reformador Joo Calvino apresentou um paralelo bastante didtico entre a entrega da Lei e a descida do Esprito Santo. Em primeiro lugar, as Tbuas da Lei, escritas em pedra, foram entregues cinquenta dias aps a celebrao da Pscoa, no Monte Sinai. Por paralelismo, ele pondera que o Esprito Santo foi derramado cinquenta dias aps a Pscoa de Jesus, seu sacrifcio pascal, desta vez para trazer a Lei de Deus escrita em nossos coraes, como pudemos ver anteriormente em Ezequiel (36.25-27).

Ao comentar em Atos 2.2, Calvino traz um ponto muito apropriado sobre as lnguas como que de fogo que caram sobre os discpulos. O comentador francs acredita que isso tenha acontecido apenas com os onze apstolos, e no com os 120 discpulos ali presentes. H, porm, outros comentaristas do texto que aceitam, sem muitos problemas, que as lnguas como que de fogo caram sobre todos os presentes. O comentrio de Calvino aqui significativo porque tem um ponto de vista missiolgico de grande importncia:

A diversidade de lnguas impediria o evangelho de espalhar mais alm; se por acaso os pregadores do evangelho tivessem falado uma lngua apenas, todos os homens teriam pensado que Cristo tinha sido encurralado em um pequeno canto [habitado apenas por] judeus. Mas Deus inventou uma maneira pela qual o evangelho pudesse sair fora, quando dividiu as lnguas dos apstolos, a fim de que eles pudessem espalhar entre todas as pessoas aquilo que lhes foi entregue. (CALVINO, comentando em Atos 2.2).

Assim, as lnguas podem representar a graciosa ddiva da mensagem de salvao aos homens; enquanto o fogo pode ter duas interpretaes. Em primeiro lugar, Calvino v a importncia do fogo como a vibrao interior por parte daqueles que carregaro a mensagem pelo mundo. Que tal fogo est relacionado com o entusiasmo colocado dentro daquelas pessoas que compartilham ou ainda compartilharo as boas novas da salvao. Creio que h ainda uma outra parte deste significado que no pode ficar de fora: o fogo, de acordo com o testemunho de Joo, inclua o juzo final: Ele traz a p em sua mo e limpar sua eira, juntando seu trigo no celeiro, mas queimar a palha com fogo que nunca se apaga (Mt 3.12).

As muitas lnguas ali faladas, e ouvidas, tm um significado fundamental para o avano missionrio da Igreja que ali se firmava como a igreja do Novo Testamento. Simplesmente colocado, o milagre das lnguas foi a reverso de Babel. Aparentemente, este falar em lnguas aqui no para ser considerado como lnguas espirituais (cf. 1 Co 14.2). Tanto em Atos como em 1 Corntios, h lugar para lnguas vernculas, as quais precisam ser interpretadas. As lnguas faladas em Atos foram claramente lnguas vernculas, isto , lnguas faladas e entendidas por pessoas ali presentes - h pelo menos dezessete lnguas representadas na narrativa de Lucas. Estas pessoas puderem entender as maravilhas de Deus que os demais discpulos falavam (vv. 4-12). Embora haja o termo grego glossa (lngua) neste texto, h tambm o termo grego dialekto (linguagem, dialeto) mencionado no verso 6, que foi traduzido como sua prpria lngua em portugus e lngua nativa em algumas outras tradues. Ao reverter o efeito de Babel - que significa confuso -, Deus estava, assim, trazendo a mensagem de que a partir dele, no do povo, como foram em Babel, os povos do mundo sero atrados a ele pela mensagem de salvao.

Eis aqui um desafio missionrio de grandes propores. H uma grande necessidade de missionrios que possam cruzar fronteiras culturais e lingusticas a fim de levar a mensagem de boas novas do Reino de Deus a todos os povos, todas as etnias, todas as lnguas do mundo. Esse trabalho pode ser feito (e isso j acontece durante anos) atravs de vrios meios missionrios, incluindo-se, claro, o labor de traduo da Bblia entre aqueles que ainda no a tm em suas prprias lnguas.

No podemos nos esquecer que o Pentecostes foi tambm um dos maiores, se no o maior, dos avivamentos que a Igreja de Deus recebeu. Lembremo-nos que a Igreja sempre esteve presente, desde Ado e Eva. Todos quantos creram na promessa do Salvador, antes mesmo que a Lei fosse entregue, foram salvos por causa daquela promessa. Desta forma, a Igreja Invisvel, propriamente cognominada como Igreja Universal, aquela que contm todos os salvos de todos os tempos e de todos os lugares, recipiente de to grande salvao. No caso do Pentecostes, a Igreja de Jesus j existia antes do evento aqui em caso: havia uma congregao de 120 fieis esperando por tal renovao. Assim, o Pentecostes foi a renovao e restaurao da Igreja que continuaria a crescer, atraindo os chamados do Pai, at o Dia do Senhor, a Segunda Vinda de Cristo.

Em resumo, o maior presente que Jesus derramou sobre a Igreja, ao derramar o Esprito Santo, foi o poder para sua Igreja se tornar uma igreja missionria. Foi a partir de tal batismo com o Esprito Santo que a Igreja de Deus foi comissionada para alcanar as naes com a mensagem do Evangelho do Reino de Deus.


Ehud Marques Garcia PhD em Estudos Interculturais pelo Seminrio Teolgico Fuller, Pasadena, Califrnia (EUA). pastor evanglico presbiteriano e serviu como missionrio nos Estados Unidos, Canad e Rssia. Atualmente, diretor acadmico do Centro Evanglico de Misses (CEM).

Nota:
Esta a primeira parte do artigo. A segunda parte que ser publicada em breve - tem como nfase a mensagem de Pedro em Atos 2.14-36.


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