Entrevista com Manfred Grellert

Ao celebrarmos os 70 anos de existncia da
World Vision International (WVI) e os 45 anos da Viso Mundial Brasil (VM), lembramos com gratido da vida de Manfred Grellert, sua esposa, Lianne, e seus quatro filhos. Manfred foi, at hoje, o brasileiro que teve a mais longa influncia na jornada da WVI, onde desempenhou as funes de diretor da VM Brasil, vice-presidente da WV na Amrica Latina e diretor em formao espiritual, em mbito global.
No decorrer de sua longa e intensa dedicao VM/WVI, de 1980 a 2009, ele sempre destacou o compromisso com um evangelho integral, com as crianas a partir de suas famlias e comunidades e a intensa labuta pela transformao sociopoltica e econmica das comunidades mais pobres onde a VM estava envolvida. Deixemos que ele mesmo fale do que ele viveu.
Manfred, como voc se apresentaria a algum que no o conhece? Conte um pouco da sua histria.
Nasci em 1941, num lugarzinho chamado Lajeado Candeia, onde no havia luz eltrica nem gua encanada, no interior do Rio Grande do Sul. Meu pai era pastor numa igreja composta, em sua maioria, por filhos de migrantes alemes. Em nosso lar havia uma profunda devoo a Jesus Cristo e Palavra de Deus. Ter estudado em bons colgios evanglicos luteranos e ter sido formado por igrejas que buscavam prover boa formao com diverso sadia para os jovens foi propcio para eu discernir a minha vocao ministerial. Depois de estudar teologia no Seminrio Batista do Sul, de 1961 a 1964, e casar-me com a tambm gacha Lianne Brenner, em 1965 ns seguimos para um programa de estudos doutorais em Louisville, KY, nos Estados Unidos.
Quando voltamos ao Brasil, em 1970, fui ensinar teologia no Seminrio Batista do Norte. Poucos meses depois, aceitei o convite para pastorear a Primeira Igreja Batista da Capunga. Trabalhei intensamente, me envolvi na vida denominacional e conheci a realidade do Nordeste, este Brasil que eu desconhecia e onde fomos recebidos de braos abertos. Depois de dez anos, j com uma famlia de seis pessoas, samos de l para assumir a direo da VM Brasil em Belo Horizonte.
Nos Estados Unidos, em 1965, eu havia me deparado com um pas em profunda convulso social, uma intensa luta dos negros pelos seus direitos civis; e isto exigia novas reflexes teolgicas e ticas com as quais eu tinha de me ocupar. Ao voltar para o Brasil, encontrei um ambiente de fermentao teolgica e me vi em meio a vrios acontecimentos que foram me moldando e que eu procurava integrar no meu ensino teolgico, em que o pobre e a justia eram eixos fundamentais.
Em minha caminhada evanglica, fui convidado a participar do notrio Congresso Internacional de Evangelizao Mundial, em Lausanne, Sua, 1974, onde percebi o empenho por uma evangelizao baseada na integridade e integralidade do evangelho. Um ponto alto deste evento foi, para mim, a noite em que o argentino Juan Ortiz e Stanley Mooneyham, ento presidente da WVI, falaram acerca do poder transformador do evangelho em meio s comunidades pobres; ali eu disse a mim mesmo que, um dia, gostaria de fazer parte de algo dessa natureza. Este meu encontro com esta viso integral e ntegra do evangelho veio a se aprofundar e intensificar quando, em 1979, participei do Segundo Congresso Latino-Americano de Evangelizao (CLADE), em Lima, Peru, onde encontrei uma pujante Fraternidade Teolgica Latino-Americana (FTL) militando por uma prtica de misso transformadora na sofrida Amrica Latina.
Algumas coisas comearam a clarear dentro de mim, em meio a estas diferentes andanas: o seguimento a Jesus Cristo demandava uma vida indelevelmente marcada pela vida do prprio Jesus. Ademais, o testemunho, o servio e a luta pela justia envolviam a cabea, o corao e as mos, levando a misso a buscar por uma espiritualidade marcada pelo carter de Deus e por um servio concreto ao prximo, especialmente o pobre.
A VM entrou na sua vida em 1980. Por que voc aceitou o desafio de ser o primeiro diretor nacional da VM no Brasil?
Os anos em que exerci a direo nacional na VM, aqui no Brasil, foram igualmente intensos. Numa deciso estratgica, amos a priorizar a nossa atuao no Nordeste, onde ficava o Brasil mais pobre e onde ramos ausentes. Em termos da nossa linha de atuao, caminhamos de uma proposta assistencialista para projetos comunitrios com o empoderamento de lderes locais, e para a luta contra a injustia e a busca dos direitos das comunidades mais pobres.
O nosso envolvimento com o mundo evanglico brasileiro e suas lideranas pastorais foi igualmente intenso. Ao mesmo tempo em que se intensificava este relacionamento com o mundo evanglico, mantnhamos contato com a Conferncia Nacional dos Bispos do Brasil e procurvamos estabelecer uma presena no espao governamental do pas.
O tempo foi, de fato, curto, pois j em 1985 a WV me levou a uma posio de vice-presidncia com a responsabilidade de coordenar o trabalho na Amrica Latina. As linhas de ao que haviam sido pioneiras no Brasil foram levadas para a Amrica Latina, com nfase no desenvolvimento comunitrio e na busca de justia para as comunidades pobres, mas agora acrescidos de um programa de microcrdito visando a autonomia financeira e econmica dessas comunidades.
Voc exerceu vrias funes na WV e teve grande influncia na Organizao. Voc marcou a WV e esta marcou voc. Como foi isso">O Deus da Justia e a Justia de Deusrene uma seleo preciosa de textos, com abordagem bblica e experincias concretas de homens e mulheres de diferentes nacionalidades e um ministrio comum: a busca pela justia. E, diga-se, a justia no um tema abstrato.