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Lembrem-se dos que esto na priso 4y6i1u

Por Elben Csar

Fui a So Paulo no dia 9 de maio de 2006 especialmente para visitar pelo menos duas penitencirias, providncias tomadas por Eldman F. Eller, capelo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, junto Secretaria de istrao Penitenciria (SAP). No podia imaginar que no final daquela semana, So Paulo experimentaria a mais sangrenta guerra urbana de sua histria, provocada pela faco criminosa conhecida como Primeiro Comando da Capital (PCC), com 105 rebelies em presdios, 82 nibus incendiados, 17 agncias bancrias atacadas e mais de 160 mortos entre suspeitos, agentes da lei, detentos e civis inocentes.

Tivemos uma longa conversa com a jornalista Rosngela Sanches, assessora de imprensa da SAP, rgo criado em 1993 para istrar as 144 unidades prisionais, onde vivem 123.327 encarcerados (dados de abril de 2006). Rosngela nos contou que o sistema prisional recebe setecentos novos presos por ms e que cada encarcerado custa ao Estado setecentos reais mensais em mdia. Mentalmente multipliquei esse valor pelo nmero de pessoas atrs das grades e achei a fabulosa quantia de 86 milhes de reais (s no Estado de So Paulo). Naquele escritrio havia um cartaz afixado na parede com os seguintes dizeres: A lei 7.210, de 11 de julho de 1984, protege o preso contra reportagens sensacionalistas. A carapua no me serviu.

A pior coisa do mundo
A Epstola aos Hebreus tem toda a razo quando exorta os seus leitores a se lembrarem dos que esto na priso como se aprisionados com eles (Hb 13.3). Pois, como escreveu J. K. Rowling, a pior coisa do mundo o encarceramento. E as razes so muitas.

Alm da privao de liberdade, que por si s j algo invel, corre-se mais risco de vida nos presdios do que fora deles. Qualquer briga nas celas, nos pavilhes, nos corredores e nos ptios pode terminar em morte. Qualquer desconfiana de que um preso teria delatado outro motivo de assassinato. O no pagamento de uma dvida, mesmo irrisria, pode custar a morte do devedor. Uma vez, um funcionrio do Carandiru pagou do seu prprio bolso um pacote de cigarro que um ladro devia, s para evitar um homicdio a mais em seu pavilho. Os mais perigosos se impem pelo poder e no pela fora fsica. Drauzio Varella conta que o maior brutamontes da antiga Casa de Deteno foi assassinado, enquanto dormia, por um branquinho obstinado de 44 quilos. Curioso que os bandidos no am o estupro: Estuprador jamais aceito e, se desmascarado, corre risco de vida. Preso abusado sexualmente s ser itido se matar seus ofensores, acrescenta Varella (Carandiru, p.77). Eles matam tambm aqueles que vo parar na cadeia por terem abusado de algum menor. Um abusador foi esfaqueado at a morte menos de uma hora depois de ter chegado algemado ao presdio.

Muitos presos cometem suicdio nos presdios. Em 2004, houve 403 bitos nas unidades prisionais do Estado de So Paulo. Destes, 35 foram pessoas que tiraram a sua prpria vida (quase 10% de todas as mortes). O mesmo acontece em outras prises do mundo. O nmero de suicdios em prises americanas enorme: a taxa superior a cem por cem mil. Desde 2002 j houve 39 tentativas de suicdio entre os prisioneiros que esto na base militar americana de Guantnamo. Um deles, de 32 anos, j tentou se matar doze vezes (Jornal do Brasil, 20/05/06). A explicao dada pelo filsofo alemo Arthur Schopenhauer aceitvel: Assim que o terror da vida ultraa o terror da morte, o homem pe fim na sua vida. Referindo-se sua experincia no Carandiru, Varella explica que os suicdios acontecem de manh, depois de noites de presso ou pnico claustrofbico, espremidos entre os outros, sem poder chorar.

Se tudo isso no bastasse para tornar o encarceramento a pior coisa do mundo, ainda h o risco de pegar doena contagiosa (principalmente tuberculose), o sentimento de culpa que persegue no poucos encarcerados, a pavorosa mistura entre presos culpados de crimes leves com presos culpados de crimes hediondos, a invel morosidade da justia brasileira, o abandono da famlia (quase 30% no recebem visita alguma), aquela tenso sexual que deixa os presos ardendo de desejo (1Co 7.9) e a gritante injustia entre o criminoso pobre que no tem como pagar advogado para sair da cadeia e o criminoso rico que tem como pagar advogado para no entrar na cadeia (basta lembrar os recentes casos do jornalista Antonio Pimenta Neves e de Suzana Richthofen). Logo na entrada do Carandiru havia uma placa de cobre na qual estava escrito: mais fcil um camelo ar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar preso na Casa de Deteno.

Presdios femininos do Estado mais rico do Brasil abrigam 4 mil mulheres
Elas poderiam estar com os pais ou com marido e filhos ou mesmo sozinhas. Mas no esto. No momento, essas mulheres esto atrs das grades em onze diferentes presdios no Estado de So Paulo. Quase metade das 3.930 detentas foi condenada por trfico de drogas (48,5%). Mais da metade so reincidentes. Quase um quarto delas so moas entre 18 e 24 anos (24%). O maior grupo tendo em vista a faixa etria formado de mulheres um pouco mais velhas, entre 25 e 34 anos (42%). Mais da metade nunca se casou (54%). Poucas tm curso superior completo ou incompleto (4%). Bem mais de um tero das detentas no recebem visitas de ningum (36%). As demais, com maior ou menor freqncia, recebem visitas de avs (3%), netos (5%), tios (10%), pai (14%), companheiro (18%), irmos (45%), me (47%), filhos (48%) e outros. Quase um quarto das encarceradas tm pelo menos um filho, e 5% tm mais de seis filhos. Os filhos ficam com os avs maternos (40%), o pai (20%), os avs paternos (11%), os tios (12%), os irmos mais velhos (7%) etc. Alguns j so independentes e outros esto em orfanatos, na FEBEM ou tambm presos. Sabe-se que a guarda dos filhos mais assumida pelas companheiras dos detentos do que pelos companheiros das detentas. As mulheres entregam-se ao trabalho mais do que os homens e so mais bem remuneradas do que eles. Quanto ao uso dessa remunerao, h uma significativa diferena entre eles e elas: o homem beneficia mais ele mesmo e a mulher divide quase pela metade o dinheiro com suas necessidades pessoais e a famlia. O dado mais surpreendente que mais de um quarto das detentas declaram-se evanglicas (29%).

Durante a visita que fizemos Penitenciria Feminina da Capital, no bairro Carandiru, na Zona Norte de So Paulo, gentilmente recebidos pela senhora Marcella Luciana Paolone, assessora da diretora dra. Ivete Baro Azevedo Halasc, perguntamos se seria possvel nos encontrar com Adriana Nicoletti de Amorim, uma detenta de 31 anos, de origem evanglica, cujo pai, recentemente falecido, morava numa cidade prxima a Viosa, MG. No pequeno encontro que tivemos com a moa, o capelo Eldman Eller orou por ela e eu a encorajei a permanecer ao lado do Senhor.

Quem nunca esteve na priso no sabe quanto bom no estar l
Visitamos, o capelo da Mackenzie e eu, a Penitenciria Jos Parada Neto, no municpio de Guarulhos, na companhia de seu diretor, dr. Antonio de Oliveira Filho. Vimos as salas de aula, as oficinas, os consultrios mdico e dentrio, a biblioteca, os amplos corredores, as celas e o ptio. Apertamos a mo de agentes penitencirios e detentos.

Ao ver aqueles presidirios, lembrei-me daquela me do Paran mencionada no livro de Drauzio Varella, que viajava seiscentos quilmetros de nibus duas vezes por ms para visitar o filho na antiga Casa de Deteno, em So Paulo. Por essa razo, fiquei encantado com os dizeres e os desenhos feitos pelos presos, com quatro dias de antecedncia, para receber e homenagear suas progenitoras no dia das mes. Porm a homenagem no aconteceu por causa do tumulto daquele fim de semana (13 e 14 de maio). Quem mais visita os presos so mulheres: namoradas, esposas, irms, tias e a inseparvel me. Algumas esposas trazem bebs, boa parte deles concebidos na cadeia por ocasio das chamadas visitas ntimas, que ningum sabe direito quando comearam, talvez no incio dos anos 80, na Casa de Deteno. De acordo com o ltimo censo demogrfico da SAP de So Paulo, 39% dos encarcerados no recebe visita ntima. Os 61% restantes recebem toda a semana (21%) ou pelo menos uma vez por ms (40%).

Quase a metade da populao carcerria, pelo menos no Estado de So Paulo, trabalha de segunda a sexta-feira, nas oficinas ou nas prprias celas. Em novembro de 2005, havia mais de 40 mil encarcerados fazendo isso. Cerca de duzentas empresas contratam seus servios, pagando por volta de trezentos reais por ms. Para cada trs dias de trabalho, eles ganham um dia de remisso da pena. Para diminuir cinco anos da pena, eles teriam de trabalhar quinze anos. O estmulo poderia ser bem maior!

Uma boa parte dos que esto na priso pensa apenas em fuga. S em Minas Gerais, 2.196 detentos fugiram da priso em 2005. Policiais e carcereiros esto vigiando os 51 tneis escavados ao redor da Cadeia Pblica de Tatu, SP. Alguns matam para fugir e outros morrem durante a tentativa de fuga.

A aspirao pela liberdade muito bem exposta pelo ex-detento Jos Isabel da Silva Filho, o Monarca, ao descrever o seu dia-a-dia em liberdade em artigo publicado na Folha de So Paulo: Quem no esteve na priso no sabe o quanto bom poder levantar cedo, ir trabalhar, voltar, tomar banho, andar de nibus, acordar de madrugada e sair no porto para tomar um vento na cara, essas coisas simples (Folha de So Paulo, 03/04/06).

Todos sofrem com o crime: a vtima, o criminoso, a polcia, o agente penitencirio, a famlia, a sociedade, a religio, os cofres pblicos, o pas. E todos somos culpados, em menor e maior grau. A rigor, ningum pode atirar a primeira pedra. Todos somos cmplices, de uma forma ou de outra. Ningum pode tomar partido. Se o mototaxista de So Lus do Maranho mata de madrugada o filho de 7, a ex-mulher de 31, o ex-sogro de 62, a ex-sogra de 57 e a ex-cunhada de 27, a polcia de So Paulo mata mais gente do que as polcias de todos os pases da Europa juntos (denncia do socilogo francs Loic Wacquant, publicada na Folha de So Paulo de 15/05/06). Se Suzane von Richthofen mata a pauladas com o auxlio de seu namorado o prprio pai e a prpria me, enquanto o casal dorme, a Polcia Militar invade o ento maior e mais problemtico presdio da Amrica Latina e mata 111 homens num mesmo dia. A confisso de fracasso deve ser coletiva.

Para se ter uma idia da complexidade do problema, vale a pena citar o economista Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES: Uma sociedade que deixa sua juventude desempregada uma sociedade que est semeando violncia. E para evitar partidarismo e radicalismo, precisamos dar ouvidos a outra declarao do mesmo economista: O preso tem direitos humanos, mas a populao tambm tem direito a andar na rua e no receber uma bala na cabea, a trabalhar e voltar para casa com certa normalidade (Folha de So Paulo, 21/03/06).

Os 22 Centros de Ressocializao da SAP do Estado de So Paulo e o projeto Novos Rumos na Execuo Penal de Tribunal da Justia do Estado de Minas Gerais so uma luz no final do tnel e devem ser saudados com muita alegria e esperana. O objetivo do segundo incentivar a expanso da Associao de Proteo e Assistncia aos Condenados (APAC).

Seja atravs dessas novas medidas, seja atravs de iniciativas particulares, seja atravs de pregao do evangelho, o mtodo sugerido pelo autor da Epstola aos Hebreus de um acerto incrvel: Lembrem-se dos que esto na priso, como se aprisionados com eles!

Nota: Texto publicado originalmente na edio 301 (jul/ago 2016) da revista Ultimato.

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Elben Magalhes Lenz Csar foi o fundador da Editora Ultimato e redator da revista Ultimato at a sua morte, em outubro de 2016. Fundador do Centro Evanglico de Misses e pastor emrito da Igreja Presbiteriana de Viosa (IPV), autor de, entre outros, Por Que (Sempre) Fao o Que No Quero?, Refeies Dirias com Jesus, Mochila nas Costas e Dirio na Mo, Para (Melhor) Enfrentar o Sofrimento, Conversas com Lutero, Refeies Dirias com os Profetas Menores, A Pessoa Mais Importante do Mundo, Histria da Evangelizao do Brasil e Prticas Devocionais. Foi casado por sessenta anos com Djanira Momesso Csar, com quem teve cinco filhas, dez netos e quatro bisnetos.
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