Vozes femininas na Reforma 4k2c51

Por Rute Salviano Almeida

Tiveram as mulheres alguma participao na Reforma Protestante?

A histria positivista, escrita por mos masculinas e enfocando grandes acontecimentos e personagens, esqueceu ou no se importou de mencionar a participao das mulheres na reforma religiosa do sculo XVI. Foram poucas e pequenas as menes sobre elas. Portanto, para uma escrita mais verdadeira da Histria necessrio resgatar essa valiosa contribuio feminina, porque quando a histria contada pela metade no est completa.

Na poca da Reforma, bastava que as mulheres soubessem fiar, cuidar dos trabalhos da casa e de maneira alguma se intrometer em assuntos da f. Porm, o sentimento religioso estava presente em muitas delas e, ao tomarem conhecimento das novas da Reforma, as aceitaram e batalharam por divulgar sua mensagem.

Contudo, embora relevante, a participao feminina no movimento foi diferente, pois no produziu grandes tratados teolgicos e nem atuou em srios debates. As mulheres preferiram uma abordagem mais branda, atravs de uma literatura mais ntima.
Nesse artigo sero apresentadas algumas mulheres que realmente contriburam para a divulgao do movimento por seu envolvimento no meio eclesistico ou poltico. Suas vozes sero ouvidas atravs de suas frases.

Marie Dentire (1495-1562), teve seu nome inscrito no muro dos reformadores em Genebra, em 2002. Ex-prioresa das agostinianas, aps ficar viva, casou-se com o companheiro de Farel, o reformador Froment, com quem foi para Genebra defender a causa reformista. A carta que escreveu para rainha Margarida de Navarra foi considerada um tratado teolgico. Nela discorreu sobre a importncia de mulheres no enterrarem seus talentos: "Se Deus tem dado graa a algumas boas mulheres, revelando-lhes algo santo e bom atravs de suas Escrituras Sagradas, podem elas, por causa dos difamadores da f, absterem-se de pr no papel, falar ou declarar isto umas s outras? Ah! Pode ser muito imprudente esconder o talento que Deus nos tem dado, ns que deveramos ter a graa de perseverar at o fim.

Catherine Zell (1497-1562), esposa do pastor luterano Matheus Zell, escreveu panfletos para propaganda da Reforma. Com inteligncia e sabedoria, ela confrontava perspicazmente com a Bblia a doutrina do sacerdcio de todos os crentes. Ao ser considerada uma perturbadora da paz, declarou: "Eu sou uma perturbadora da paz? Sim, de fato, da minha prpria paz. Vocs chamam isso de paz? A perturbadora que ao invs de gastar seu tempo em divertimentos frvolos, visitou os infestados pela praga e realizou enterros? Tenho visitado os presos sob sentena de morte. o, muitas vezes, trs dias e trs noites sem comer e dormir. Eu nunca usurparia o plpito, mas eu tenho feito mais do que qualquer ministro ao visitar os miserveis. isto que perturba a paz da igreja? Como fez o apstolo Paulo em 2 Corntios, as falsas acusaes foram a loucura da auto-defesa, mas sempre com o propsito de defender um direito da mulher ao ministrio bblico.

rgula von Grumbach (1492-1554), bvara erudita, escritora de panfletos, que defendeu veementemente a Reforma e os reformadores. Em sua apologia argumentou Universidade de Ingolstadt: Vocs desejam destruir toda a obra de Lutero. Nesse caso destruiriam o Novo Testamento que ele traduziu. Nos escritos de Lutero e Melanchton, no existe nenhuma heresia (...). Estou disposta a ir Alemanha discutir com vocs e no precisam usar a traduo da Bblia de Lutero. Podem usar a catlica que foi escrita h 31 anos.

Margarida de Navarra (1492-1549), irm do rei Francisco I da Frana e esposa do rei Henrique II de Navarra. Ela acolheu em seu reino reformadores e eruditos perseguidos, entre eles o prprio Calvino. Entre suas obras, encontram-se um poema espiritual: O Espelho das almas pecadoras e um livro de contos O Heptameron, no qual denunciou a imoralidade de clrigos que, indignados, tentaram mat-la. Fez mudanas eclesisticas em seu reino: celebrao da ceia em duas espcies, cultos na lngua do povo, abolio do celibato e das roupas litrgicas dos ministros. Seu maior destaque, contudo, foi sua grande humanidade, a ponto de preferir ser chamada a primeira-ministra dos pobres. Sobre ela foi escrito: Lembremo-nos sempre dessa graciosa Rainha de Navarra em cujos braos nosso povo, ao fugir da priso ou da fogueira, encontrou segurana, honra e amizade. Nossa gratido a vs, querida Me de nossa Renascena!. Vossa casa foi a casa de nossos santos e vosso corao o ninho de nossa liberdade.

Joana dAlbret (1528-1572), filha de Margarida de Navarra e me do rei Henrique IV, que concedeu a liberdade religiosa na Frana. Foi a reformadora do seu reino e lder dos huguenotes. Ela confiscou os bens da igreja e distribuiu aos pobres, aboliu as procisses pblicas, retirou imagens e suprimiu missas. Fundou a Faculdade em La Rochelle, um centro de piedade evanglica. Foram suas palavras: A Reforma parece to verdadeira e necessria que considero deslealdade e covardia para com Deus, com minha conscincia e com meu povo permanecer mais tempo indecisa.

As mulheres na Reforma propagaram uma religio de amor: sem debates ostensivos, sem rituais e sem violncias. Elas contriburam com amparo aos perseguidos, visitas aos presos, cuidados dos doentes e necessitados. Intelectualmente tambm cooperaram com seus panfletos, poesias, cartas, contos e pregaes sobre a salvao pela f.

Essas mulheres do ado nos inspiram sobremodo por sua criatividade, discernimento, conhecimento bblico e teolgico e, principalmente, por seu grande amor ao Reino de Deus.

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