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05 de dezembro de 2024
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Estilos literrios presentes na Bblia 591ct
A multiforme Palavra para multiformes pessoas e etnias
Por Paulo Teixeira
No pretendo gastar estas preciosas linhas descrevendo cada gnero literrio presente no Livro dos livros. Esta informao est registrada em um nmero expressivo de obras disponveis em portugus em manuais bblicos, por exemplo. L, o caro leitor encontrar farta informao sobre o gnero narrativo, legal, potico, sapiencial, proftico, cronstico, epistolar e apocalptico, bem como sobre contos curtos, sagas, genealogias, parbolas e aplogos da Bblia.
Ter todos esses gneros reunidos numa s obra, escrita ao longo de pelo menos 1.500 anos, por cerca de quarenta escritores diferentes, vivendo em pocas e lugares distintos, em trs idiomas, faz da Bblia e de cada livro que a compe uma obra literria singular. E, ao perceber que todo o contedo bblico, intencionalmente, se organiza ao redor de Jesus Cristo e a ele remete, damo-nos conta de que este livro, embora escrito por homens e em linguagem humana, s poderia ter nascido, assim como o prprio ser humano no relato de Gnesis 2, de um sopro divino que costumamos chamar de inspirao. Da o justo reconhecimento dessa Bblia como a santa e inspirada Palavra de Deus, uma mensagem que quer chegar, na viso de Apocalipse 5, a pessoas de toda tribo, lngua, povo e nao.
Mas, ainda que a gentica e a cultura confiram a indivduos de uma mesma etnia certos traos afins, a peculiaridade de cada pessoa continua fazendo dele ou dela um universo em si. A psicologia cognitiva demonstra que o ser humano multissensorial e adquire ou constri conhecimento de maneiras diversas. A teoria do conhecimento reconhece e descreve variados estilos de aprendizagem. Deus quer alcanar a todos, mas isso acontece, amorosamente, de pessoa por pessoa, na pessoa do Filho que foi dado em favor do mundo e que precisa ser conhecido e crido por todo ser humano que habita esta terra.
Alcanar a todas as pessoas um desafio perene dessa Palavra. E exatamente neste ponto que enxergo a sabedoria de Deus em trazer existncia uma multiforme Palavra, que transmita a multiforme graa divina s multiformes pessoas espalhadas pelo mundo. Para um ser humano to diverso, Deus providenciou Escrituras igualmente diversificadas, o que se v, de maneira mais notria, ao pensar nos estilos literrios presentes na Bblia.
Trabalhando h algumas dcadas na rea da traduo bblica, tenho o privilgio de contemplar como diferentes estilos, pores e aspectos da Palavra de Deus captam a ateno de diferentes pessoas e etnias. Para melhor compreenso, explico brevemente um dos mtodos utilizados para iniciar uma traduo bblica.
Uma pergunta fundamental que se faz a um grupo tnico antes de comear uma traduo propriamente dita qual livro ou trecho bblico o grupo gostaria de traduzir primeiro. Em se tratando de primeiras tradues para uma lngua, geralmente o conhecimento bblico bastante limitado ou mesmo nulo, o que leva o consultor ou facilitador da traduo a ar semanas, seno meses, compartilhando com representantes da etnia histrias e mais histrias da Bblia. Tal mtodo permite que a comunidade lingustica tenha uma percepo mais ampla do contedo bblico e com ele estabelea relevantes conexes culturais e espirituais.

Compartilhada e conhecida uma boa variedade de histrias bblicas, os calns etnia cigana que vive no Brasil foram indagados sobre por qual livro ou histria, na opinio deles, a traduo bblica poderia comear. Rute, responderam, o que, de certa forma, surpreendeu os missionrios. A razo da escolha, no entanto, surpreenderia ainda mais. Segundo aquele grupo, o livro de Rute tinha muitos ciganos, numa aluso a pessoas em constante deslocamento, organizao familiar em cls e a vrios enredos que se entrecruzam no tempo e no espao. Contudo, o que chamou mesmo a ateno foi a resposta sobre que parte de Rute os calns mais apreciaram na histria. O desfecho disseram, mas no o nascimento do filho de Rute e Boaz, e sim o seguinte trecho:
E estas so as geraes de Perez:
Perez gerou Esrom,
Esrom gerou Ro,
Ro gerou Aminadabe,
Aminadabe gerou Naassom,
Naassom gerou Salmom,
Salmom gerou Boaz,
Boaz gerou Obede,
Obede gerou Jess,
e Jess gerou Davi (Rute 4.18-22, NAA).
Sim, a genealogia um gnero to pouco apreciado pela maioria dos leitores da Bblia encantou os calns! Naquela cultura, assim como entre alguns povos da frica e do Oriente, genealogias demonstram a importncia de algum medida que o registro da linhagem amplifica a histria pessoal, mesclando-a com as histrias de outros indivduos que vieram antes, dos quais e com os quais se aprendem saberes, fazeres e deveres. Isso para que, finda a jornada, um dia se possa ser lembrado na genealogia de algum descendente como um ancestral digno, algum que, para alm de um nome, deixou um legado.
E como os calns ouviram histrias de Davi e de Jesus, a conexo cristolgica se manifestou de maneira praticamente natural. Alis, as genealogias de Cristo nos Evangelhos de Mateus e de Lucas, que retrocedem at aos tempos primevos da criao, so um dos argumentos mais fortes para que um cigano do Brasil ou um indivduo de grupos do interior da China ou de etnias do Chade e do Mali reconheam a singularidade, a sublimidade e a relevncia de Cristo em comparao com a precariedade, a falibilidade e a limitao de outros seres humanos homens e mulheres. Tal reconhecimento abre perspectivas evangelsticas enormes, s aprendidas no contexto missionrio por quem est aberto a ser usado pelo Esprito de Deus para construir pontes entre a Bblia e as pessoas com suas variadas culturas e percepes.
Em meados do sculo ado, C. S. Lewis j ponderava que Deus nunca se faz de filsofo diante de uma lavadeira. Jesus usa linguagem erudita, acadmica, com Nicodemos, o rabino, afeito retrica judaica das sinagogas e do Sindrio. Mas com as crianas, proibidas de se aproximar e tocar num mestre para no o contaminar ritualmente, Jesus prefere e se permite o abrao, o colo e a bno com imposio de mos. Jesus mesmo, chamado em Joo 1 de o Verbo ou a Palavra, foi canal multiforme da multiforme graa de Deus para multiformes pessoas e grupos tnicos. um mesmo e nico Salvador em muitos estilos, assim como a Bblia e isso muito bom. Nunca conseguiramos enxergar a estatura de sua glria no fosse ele baixar at ns, servindo a cada um de ns em verdade e graa da maneira que melhor nos convm.
REVISTA ULTIMATO BBLIA: REVELAO E LITERATURA
Ultimato mostra, entre outras coisas, a riqueza das Escrituras quando lidas como literatura, sem diminuir o seu carter sagrado a sua inspirao divina.
E reafirmamos o que publicamos em outra edio recente: A Bblia Ainda Fala As Escrituras contm a narrativa que d sentido, esclarece e comunica a soberania e sabedoria de Deus. A lealdade ao que est exposto no Livro deve ser a marca dos cristos.
disso que trata a matria de capa da edio 410 da revista Ultimato. Para , clique aqui.
Saiba mais:
A Bblia Um livro como nenhum outro, John Stott e Tim Chester
Por que Confiar na Bblia? Respostas a dez perguntas difceis, Amy Orr-Ewing
Por Paulo Teixeira

Ter todos esses gneros reunidos numa s obra, escrita ao longo de pelo menos 1.500 anos, por cerca de quarenta escritores diferentes, vivendo em pocas e lugares distintos, em trs idiomas, faz da Bblia e de cada livro que a compe uma obra literria singular. E, ao perceber que todo o contedo bblico, intencionalmente, se organiza ao redor de Jesus Cristo e a ele remete, damo-nos conta de que este livro, embora escrito por homens e em linguagem humana, s poderia ter nascido, assim como o prprio ser humano no relato de Gnesis 2, de um sopro divino que costumamos chamar de inspirao. Da o justo reconhecimento dessa Bblia como a santa e inspirada Palavra de Deus, uma mensagem que quer chegar, na viso de Apocalipse 5, a pessoas de toda tribo, lngua, povo e nao.
Mas, ainda que a gentica e a cultura confiram a indivduos de uma mesma etnia certos traos afins, a peculiaridade de cada pessoa continua fazendo dele ou dela um universo em si. A psicologia cognitiva demonstra que o ser humano multissensorial e adquire ou constri conhecimento de maneiras diversas. A teoria do conhecimento reconhece e descreve variados estilos de aprendizagem. Deus quer alcanar a todos, mas isso acontece, amorosamente, de pessoa por pessoa, na pessoa do Filho que foi dado em favor do mundo e que precisa ser conhecido e crido por todo ser humano que habita esta terra.
Alcanar a todas as pessoas um desafio perene dessa Palavra. E exatamente neste ponto que enxergo a sabedoria de Deus em trazer existncia uma multiforme Palavra, que transmita a multiforme graa divina s multiformes pessoas espalhadas pelo mundo. Para um ser humano to diverso, Deus providenciou Escrituras igualmente diversificadas, o que se v, de maneira mais notria, ao pensar nos estilos literrios presentes na Bblia.
Trabalhando h algumas dcadas na rea da traduo bblica, tenho o privilgio de contemplar como diferentes estilos, pores e aspectos da Palavra de Deus captam a ateno de diferentes pessoas e etnias. Para melhor compreenso, explico brevemente um dos mtodos utilizados para iniciar uma traduo bblica.
Uma pergunta fundamental que se faz a um grupo tnico antes de comear uma traduo propriamente dita qual livro ou trecho bblico o grupo gostaria de traduzir primeiro. Em se tratando de primeiras tradues para uma lngua, geralmente o conhecimento bblico bastante limitado ou mesmo nulo, o que leva o consultor ou facilitador da traduo a ar semanas, seno meses, compartilhando com representantes da etnia histrias e mais histrias da Bblia. Tal mtodo permite que a comunidade lingustica tenha uma percepo mais ampla do contedo bblico e com ele estabelea relevantes conexes culturais e espirituais.

Compartilhada e conhecida uma boa variedade de histrias bblicas, os calns etnia cigana que vive no Brasil foram indagados sobre por qual livro ou histria, na opinio deles, a traduo bblica poderia comear. Rute, responderam, o que, de certa forma, surpreendeu os missionrios. A razo da escolha, no entanto, surpreenderia ainda mais. Segundo aquele grupo, o livro de Rute tinha muitos ciganos, numa aluso a pessoas em constante deslocamento, organizao familiar em cls e a vrios enredos que se entrecruzam no tempo e no espao. Contudo, o que chamou mesmo a ateno foi a resposta sobre que parte de Rute os calns mais apreciaram na histria. O desfecho disseram, mas no o nascimento do filho de Rute e Boaz, e sim o seguinte trecho:
E estas so as geraes de Perez:
Perez gerou Esrom,
Esrom gerou Ro,
Ro gerou Aminadabe,
Aminadabe gerou Naassom,
Naassom gerou Salmom,
Salmom gerou Boaz,
Boaz gerou Obede,
Obede gerou Jess,
e Jess gerou Davi (Rute 4.18-22, NAA).
Sim, a genealogia um gnero to pouco apreciado pela maioria dos leitores da Bblia encantou os calns! Naquela cultura, assim como entre alguns povos da frica e do Oriente, genealogias demonstram a importncia de algum medida que o registro da linhagem amplifica a histria pessoal, mesclando-a com as histrias de outros indivduos que vieram antes, dos quais e com os quais se aprendem saberes, fazeres e deveres. Isso para que, finda a jornada, um dia se possa ser lembrado na genealogia de algum descendente como um ancestral digno, algum que, para alm de um nome, deixou um legado.
E como os calns ouviram histrias de Davi e de Jesus, a conexo cristolgica se manifestou de maneira praticamente natural. Alis, as genealogias de Cristo nos Evangelhos de Mateus e de Lucas, que retrocedem at aos tempos primevos da criao, so um dos argumentos mais fortes para que um cigano do Brasil ou um indivduo de grupos do interior da China ou de etnias do Chade e do Mali reconheam a singularidade, a sublimidade e a relevncia de Cristo em comparao com a precariedade, a falibilidade e a limitao de outros seres humanos homens e mulheres. Tal reconhecimento abre perspectivas evangelsticas enormes, s aprendidas no contexto missionrio por quem est aberto a ser usado pelo Esprito de Deus para construir pontes entre a Bblia e as pessoas com suas variadas culturas e percepes.
Em meados do sculo ado, C. S. Lewis j ponderava que Deus nunca se faz de filsofo diante de uma lavadeira. Jesus usa linguagem erudita, acadmica, com Nicodemos, o rabino, afeito retrica judaica das sinagogas e do Sindrio. Mas com as crianas, proibidas de se aproximar e tocar num mestre para no o contaminar ritualmente, Jesus prefere e se permite o abrao, o colo e a bno com imposio de mos. Jesus mesmo, chamado em Joo 1 de o Verbo ou a Palavra, foi canal multiforme da multiforme graa de Deus para multiformes pessoas e grupos tnicos. um mesmo e nico Salvador em muitos estilos, assim como a Bblia e isso muito bom. Nunca conseguiramos enxergar a estatura de sua glria no fosse ele baixar at ns, servindo a cada um de ns em verdade e graa da maneira que melhor nos convm.
- Paulo Teixeira secretrio de Traduo e Publicaes da Sociedade Bblica do Brasil

Ultimato mostra, entre outras coisas, a riqueza das Escrituras quando lidas como literatura, sem diminuir o seu carter sagrado a sua inspirao divina.
E reafirmamos o que publicamos em outra edio recente: A Bblia Ainda Fala As Escrituras contm a narrativa que d sentido, esclarece e comunica a soberania e sabedoria de Deus. A lealdade ao que est exposto no Livro deve ser a marca dos cristos.
disso que trata a matria de capa da edio 410 da revista Ultimato. Para , clique aqui.
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